Nesse sentido, é muito importante reprisar aquilo que pontuei: o que nos torna mais aptos a ser afetados pelo cinema não é simplesmente uma questão de quantidade de filmes vistos. Não “entenderá” mais de cinema quem mais filmes tiver assistido. Todavia, é preciso reconhecer que um filme possui diversos elementos de significação, ele é um hipertexto onde imagem e som formam uma rede de informações arbitrariamente conduzida por um ritmo. Este, sob controle de um processo de edição, antecipa o contato da obra com o observador, que ao final, fará a leitura desse processo. Entretanto, até que ponto nós, enquanto espectadores, somos devidamente preparados para entender a complexa dinâmica dessa montagem?
A estrutura de um filme é reconhecida a partir de dois elementos básicos: a forma e o estilo. Evidentemente, obras mais convencionais não apresentam muitas dificuldades de assimilação pelo fato do público já está bem acostumado a lidar com elas. Comparando com a literatura, alguém que sempre lê um determinado gênero, como contos de fadas ou livros de autoajuda, terá sempre facilidade para compreendê-lo, pois já está bastante familiarizado com essas narrativas, mas pode sentir alguma dificuldade diante de textos que apresentam outras concepções estéticas e até mesmo temáticas. É por isso que projetos escolares são desenvolvidos para que o aluno tenha contato com variadas formas e estilos de texto, para que possuam, enfim, uma competência leitora diversificada.
Sem dúvida, afirmo que essa é a razão de ser da seção Textos e telas: sugerir livros que possam nos ajudar a compreender melhor a linguagem do cinema. Por isso mesmo, o título que inaugura essa sequência é justamente “A linguagem do cinema”, escrita por Robert Edgar-hunt, John Marland e Steven Rawle, texto que se propõe a explorar “os meios pelos quais o cinema comunica sentido para o seu público, ajudando o leitor a fazer a transição de um consumidor de filmes para um profissional que utiliza ativamente a linguagem do cinema”.
O livro “A linguagem do cinema” é dividido em seis capítulos, cada um dedicado a um aspecto da produção de sentidos a partir do filme: semiótica, narrativa, intertextualidade, ideologia, quadros e imagens e construção de sentido. Em cada uma dessas seções, os autores propõem não só uma conceituação de cada um desses elementos, mas procuram contextualizar sua evolução, apresentam exemplos de como cada um deles se inserem nos filmes e dão sugestões de leitura para aprofundamento. Ricamente ilustrado, muitos dos exemplos citados são facilmente percebidos através das imagens disponibilizadas.
Outro aspecto que torna esse livro uma excelente introdução aos temas nele tratados é a possibilidades de “praticarmos” sua observação. Em cada um dos capítulos são sugeridos exercícios, além de um interessante estudo de caso, em que, a partir da escolha de um determinado filme, os leitores/espectadores são convidados a tentar perceber como se aplicam todos os elementos relativos ao que foi discutido. Por exemplo, no primeiro capítulo, que trata da semiótica, a abra escolhida foi “Seven – os sete crimes capitais” (dir.: David Fincher: 1995). Nesse caso, é fundamental que quem estiver lendo o livro, veja esses filmes e procure “resolver” aquilo que é proposto pelos autores, pois torna a experiência muito mais proveitosa. No caso da obra citada, uma das perguntas feitas ao leitor/espectador é: “Seven – os sete crimes capitais é um amálgama de signos e utiliza o “mito” familiar dos sete pecados capitais como esqueleto da história. Que outros signos estão em funcionamento para que você saiba que está assistindo a um suspense?”
Josemar de Medeiros Cruz
Referência para citação: HUNT, Robert-Edgar; MARLAND, John; RAWLE, Steven. A linguagem do cinema. Porto Alegre: Bookman, 2013.